Artigo: Escritores Suicidas

Bookguns | autor Robert The

Bookguns | autor Robert The

É sabido que escritores, poetas, músicos e artistas de forma geral são seres dotados de uma sensibilidade fora do comum. Razão que os tornam pessoas excepcionais no que fazem; que conseguem transpor, brilhantemente através da sua arte, sentimentos e emoções que a maioria de nós, reles mortais, não conseguiria. Porém, estudos comprovam que tais pessoas, em especial os escritores, são mais vulneráveis a problemas como depressão, alcoolismo e drogas e, consequentemente, ao suicídio.

É de se notar que muitos escritores e poetas deixam em suas obras rastros de uma alma atormentada. Muitos se escondem por trás de suas criações literárias para assim, expor de forma mais velada (ou não) suas crises existenciais, seus problemas pessoais e a forte e íntima relação com a morte. Porém, o mesmo mal que os assola parece ser o mesmo que os inspira em suas obras, publicando romances ímpares que deixaram seu legado na literatura e marcas em nós leitores que, apesar do trágico fim que os mesmos decidem tomar, continuam influenciando nossa forma de viver e pensar.

Por isso, listamos onze escritores famosos que encontraram no suicídio a solução para o fim de seus tormentos:

  1. Virginia Woolf (1882 – 1941)

virginia-woolfUma das mais importantes representantes do modernismo literário, a inglesa Virginia Woolf ficou mundialmente conhecida pela técnica narrativa inovadora do fluxo de consciência, empregada em obras como Mrs. Dalloway, Orlando e Ao Farol. De grande influência na sociedade de sua época, Virginia era considerada a maior romancista lírica de língua inglesa. Diagnosticada como portadora de doença maníaco-depressiva (também conhecido como transtorno bipolar), causada possivelmente por abusos sofridos na infância, Virginia – após deixar uma comovente carta de agradecimento e despedida ao seu marido, Leonard Woolf – encheu os bolsos de seu casaco de pedras e se jogou no Rio Ouse, afogando-se. Seu corpo só foi encontrado três semanas depois.

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  1. Sylvia Plath (1932 -1963)

sylvia_plathEmbora autora de diversos poemas, Sylvia Plath tornou-se bastante conhecida após a publicação de seu único romance em prosa, A Redoma de Vidro, de 1963, ano de sua morte. Após algumas tentativas mal sucedidas de suicídio na juventude, Sylvia conhece o também poeta Ted Hughes, com quem ela casa em 1955. Com a descoberta de que seu marido possuía uma relação extraconjugal, Sylvia o abandona e decide morar sozinha em Londres com seus dois filhos pequenos. Em 1963, Sylvia toma uma quantidade excessiva de narcóticos, colocando em seguida sua cabeça dentro do forno com o gás ligado, morrendo pouco depois. Antes ela teve o cuidado de vedar o quarto de seus filhos com pano molhado e mantimentos perto de suas camas, além de deixar a janela aberta. O corpo só foi encontrado no dia seguinte com a chegada da enfermeira contratada pela escritora. Em 2009, seu filho Nicholas, também vítima de depressão, comete suicídio enforcando-se em sua casa.

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  1. Camilo Castelo Branco (1825 – 1890)

camilocastelobrancoFoi um dos principais escritores de língua portuguesa. Criador de mais de duzentas e sessenta obras, entre elas Amor de Perdição (1862), Camilo Castelo Branco era considerado um escritor predominantemente da escola romântica, embora o mesmo enveredasse por outros estilos literários. Sofrendo de vários problemas na visão a partir de 1865, o que foi impedindo-o aos poucos de trabalhar em seus livros, o escritor, desesperado, começou a alimentar pensamentos suicidas. Mesmo procurando os melhores médicos da área e após a visita de um famoso oftalmologista em sua residência que, após examinar seus olhos e lhe recomendar descanso – antes mesmo da saída do médico – Camilo Castelo Branco, completamente desesperançoso de sua cura, desferiu um tiro de revolver em sua têmpora direita, falecendo horas depois.

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  1. Ernest Hemingway (1899 – 1961)

ernest-hemingwayEscritor norte-americano. Foi vencedor do premio Pulitzer de Ficção em 1953 e do Nobel de Literatura de 1954. Reconhecido mundialmente por clássicos como O Sol se Levanta (1926), Por que os Sinos Dobram (1940) e O Velho e o Mar (1952), Hemingway sempre retratou o tema suicídio em seus escritos. Aos 61 anos e portador de problemas como depressão, amnésia, diabetes e hipertensão, o autor colocou um fuzil dentro da boca e disparou, tirando a própria vida.

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  1. Horácio Quiroga (1879 – 1937)

horacio-quiroga_Possivelmente uma das histórias mais trágicas desta lista. Horácio Quiroga foi um grande escritor uruguaio que tornou-se muito conhecido, principalmente, após a publicação de Contos de Amor de Loucura e de Morte (sem vírgula), de 1917. Desde muito cedo o suicídio fez parte de sua vida. Quando criança, seu pai matou-se acidentalmente com um tiro de escopeta. Anos depois, seu padrasto suicidou-se em sua frente. Em 1902, Quiroga mata, acidentalmente, seu melhor amigo também com um tiro de escopeta. Em 1915 sua primeira esposa também suicidou-se após ingerir água sanitária. Em 1937, após a descoberta de um câncer de próstata e com o agravamento das crises de depressão, Quiroga põe fim a sua própria vida ingerindo cianureto. Anos depois três de seus filhos também cometeram suicídio.

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  1. Yasunari Kawabata (1899 – 1972)

yasunari-kawabataPrimeiro escritor japonês a receber o premio Nobel de Literatura em 1968. O romance que alavancou a carreira de Kawabata como escritor, inserindo-o entre os principais e mais importantes escritores japoneses foi O País das Neves, de 1937. Com apenas quatro anos tornou-se órfão de pai e mãe e, com apenas quatorze anos, já tinha perdido a irmã mais velha, seu avô e sua avó. Em seu discurso de posse do Nobel de 1968, Kawabata condenou o suicídio, porém, em 1972, após um acesso de depressão, suicidou-se em sua casa intoxicado com gás.

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  1. Yukio Mishima (1925 – 1970)

yukio-mishimaEscritor japonês que tornou-se mundialmente conhecido após a publicação dos romances Cores Proibidas (1953) e O Templo do Pavilhão Dourado (1956). Mishima ganhou fama e notoriedade, chegando a concorrer a três prêmios Nobel de Literatura e, graças à ajuda e influência de seu amigo, o também escritor Yasunari Kawabata, foi inserido nos principais círculos literários japoneses na década de 1940. Após tornar-se um líder político de extrema direita – que defendia o retorno do nacionalismo e dos valores milenares da cultura japonesa – Mishima, que era totalmente comprometido com o código de honra e conduta samurai, após uma tentativa fracassada de golpe de estado, comete o seppuku, rasgando o próprio ventre com um sabre e sendo degolado, logo em seguida e com seu consentimento prévio, por um de seus discípulos.

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  1. Vladimir Maiakovski (1893 – 1930)

vladimir-maiakovskiConsiderado por Stalin como “o melhor e mais talentoso poeta de nossa época soviética”, Maiakovski, além de poeta, era também dramaturgo e forte militante do Partido Comunista. Escreveu a primeira poesia quando esteve preso numa solitária, em 1909. Passou a sofrer de depressão após ter seu visto negado para viajar para o exterior e ter se tornado um fanático partidário. Após a conclusão do poema A Pleno Pulmões e de ter alertado sua esposa do agravamento da depressão, Maiakovski suicidou-se em sua casa, em Moscou, dando um tiro no peito.

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  1. Ana Cristina César (1952 – 1983)

ana-cristina-cesarPoetisa, ensaísta e tradutora brasileira. Ana Cristina César foi uma das principais representantes do movimento intitulado Poesia Marginal. De formação cristã, trabalhou como professora de português e inglês e traduziu diversos trabalhos, inclusive da poetisa americana Sylvia Path. Escreveu para jornais e revistas de grande circulação no Brasil, como o Jornal do Brasil, Correio Brasiliense, Folha de S. Paulo, Istoé e Veja. Sofrendo de depressão devido ao fim de um relacionamento homossexual, Ana Cristina César, então com 31 anos, atirou-se do sétimo andar do apartamento de seus pais, no Rio de Janeiro.

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  1. David Foster Wallace (1962 – 2008)

david-foster-wallaceRomancista, contista e ensaísta americano. Formou-se em Letras e Filosofia e, em 1992, ganhou uma cadeira no Departamento de Letras da Universidade de Illinois. Em 1996 publicou seu magnum opus, Graça Infinita, o que alavancou sua carreira como romancista. Wallace era considerado pelos críticos como um dos poucos romancistas que conseguia captar a voz de seu tempo, considerando-o como um representante do pós-modernismo literário. Sofrendo de depressão durante vinte anos, Wallace pôs fim ao seu sofrimento enforcando-se no pátio de sua casa, em Claremont, na California.

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  1. John Kennedy Toole (1937 – 1969)

john-kennedy-tooleRomancista norte-americano que teve seu reconhecimento literário de forma tardia, após sua morte. Enquanto em vida Toole não teve nenhum de seus romances publicados. O escritor viu sua vida ruir quando recebeu uma resposta negativa de um grande editor à publicação de seu romance Uma Confraria de Tolos, publicado postumamente na década de 1980. Na verdade, Toole se recusava a reorganizar seu romance a pedido do editor. Esse fato foi suficiente para ele entrar em colapso nervoso, tornando-se uma pessoa altamente deprimida e paranoica. Toole foi encontrado morto dentro de seu carro – dois meses depois de desaparecido – intoxicado pela inalação de monóxido de carbono. Sua obra só foi publicada anos depois, graças aos esforços de sua mãe e vendeu mais de um milhão de exemplares, ganhando o Premio Pulitzer e tornando objeto cult da literatura.

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Artigo: Maridos Escritores, Mulheres Extraordinárias

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Por Jonatas Brito


Os maridos podem até levar os méritos pela autoria de suas obras, mas, justiça seja feita, muitos escritores só chegaram ao sucesso mundial graças à ajuda de suas esposas. Sendo assim, destacamos algumas dessas mulheres extraordinárias que, mesmo trabalhando nos bastidores, contribuíram fortemente para a literatura.

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Zélia Gattai e Jorge Amado | Google Imagens

Zélia Gattai (1916 – 2008)

Que Jorge Amado é um dos mais importantes e prolíficos autores brasileiros, todos concordam. Mundialmente conhecido por obras como Capitães de Areia; Gabriela, Cravo e Canela e Dona Flor e Seus Dois Maridos, Jorge Amado encontrou em Zélia uma companheira na escrita, na política e na vida. Ambos se conheceram em 1945, em São Paulo. Convidada inicialmente por Jorge para datilografar um telegrama, Zélia passou nada mais, nada menos, que trinta anos datilografando e revisando os originais de seu marido até escrever seu primeiro livro intitulado Anarquistas Graças a Deus.

John e Joyce Fante

John e Joyce Fante | Google Imagens

Joyce Smart Fante (1913 – 2005)

O americano John Fante foi um escritor desconhecido até meados de 1980, anos antes de sua morte.  Apenas começou a chamar a atenção da crítica após um comentário entusiasmado do também escritor e poeta Charles Bukowski, que considerava Fante como sua maior referência literária. Já em idade avançada e sofrendo das complicações da diabetes, John Fante publicou, em 1982, o romance Sonhos de Bunker Hill, obra que só foi realizada graças à ajuda de sua esposa, Joyce Smart Fante, a quem ele ditou toda a obra, haja vista que o mesmo estava cego e com as pernas amputadas. John Fante morreu um ano depois.

Carolina e Machado de Assis | Google Imagens

Carolina e Machado de Assis | Google Imagens

Carolina Augusta Xavier de Novaes (1835 – 1904)

Nada mais, nada menos que a eterna esposa do escritor Machado de Assis. Casaram-se em 1869 e viveram trinta e cinco anos juntos. Mulher culta, ela teve um papel importante na formação cultural de Machado, apresentando-o os principais livros da literatura portuguesa e inglesa. Foi Carolina a responsável por auxiliar o marido em sua transição do Romantismo para o Realismo e ainda o ajudava a reescrever seus textos revisando, retificando e corrigindo os originais.

Sophia e Liev Tolstói | Google Imagens

Sophia e Liev Tolstói | Google Imagens

Sophia Tolstoia (1844 – 1919)

Esposa do conde russo Liev Tolstói, passaram longos quarenta e oito anos juntos, até a morte do marido, em 1910. Muito além de uma simples dona de casa e de ter colocado no mundo treze “pequenos Tolstói’s”, Sophia dedicava-se com prazer e afinco a corrigir, redigir e gerenciar a obra e a vida do esposo. Só em uma das maiores obras de Tolstói, o clássico Guerra e Paz, Sophia leu, corrigiu e passou a limpo sete vezes.

Vera e Vladimir Nabokov | Courtesy of The Estate of Vladimir Nabokov

Vera e Vladimir Nabokov | Courtesy of The Estate of Vladimir Nabokov

Vera Nabokov (1902 – 1991)

O sobrenome é inconfundível. Simplesmente a fiel esposa do escritor russo Vladimir Nabokov. Além de ser sua musa inspiradora, Vera e Vladimir Nabokov eram companheiros inseparáveis e, sem ela, Vladimir teria desistido de publicar várias de suas obras, principalmente a mais conhecida, Lolita, que Vera retirou várias vezes da lata de lixo e incentivou seu marido a dar prosseguimento ao que se tornaria o seu magnum opus. Facilmente era vista atrás da máquina de escrever, o que fez com que várias pessoas a acusassem de ser a verdadeira autora por trás no nome do marido. A verdade é que Vera acabou por tornar-se também uma escritora, visto que auxiliava Vladimir como secretária, tradutora e editora de sua obra. O próprio Vladimir disse, certa ocasião, sobre a mulher: “sem ela, jamais teria escrito um livro sequer”.

Anna Dostoiévskaia | Foto RIA Nôvosti

Anna Dostoiévskaia | Foto RIA Nôvosti

Anna Dostoiévskaia (1846 – 1918)

Segunda esposa do escritor russo Fiódor Dostoiévski (a primeira tinha falecido vítima de tuberculose), Anna Grigórievna Snítkina foi contratada pelo mesmo, inicialmente, para ajudá-lo como taquigrafa da novela O Jogador. A aproximação em um curto espaço de tempo foi o suficiente para que os dois se casassem em 1867, tornando-os amantes inseparáveis até o falecimento do escritor. Mesmo com altos e baixos no casamento, haja vista o fato de Dostoiévski ter se viciado em jogos de azar – o que impactou negativamente a saúde financeira de sua família – Anna sempre esteve presente auxiliando-o na criação da maioria de suas obras ora como redatora, ora como secretária.

Artigo: As Melhores Introduções da Literatura

As Melhores Introduções da Literatura

Leitores e colaboradores da Revista Bula selecionaram os melhores começos de livros da literatura universal. Dentre as mais de 150 citadas, foram escolhidas as 15 mais votadas. São elas (em ordem classificatória):

  1. Moby Dick (Herman Melville):

Chamem-me simplesmente Ismael. Aqui há uns anos não me peçam para ser mais preciso —, tendo-me dado conta de que o meu porta-moedas estava quase vazio, decidi voltar a navegar, ou seja, aventurar-me de novo pelas vastas planícies líquidas do Mundo. Achei que nada haveria de melhor para desopilar, quer dizer, para vencer a tristeza e regularizar a circulação sanguínea. Algumas pessoas, quando atacadas de melancolia, suicidam-se de qualquer maneira. Catão, por exemplo, lançou-se sobre a própria espada. Eu instalo-me tranquilamente num barco.

  1. Notas do Subsolo (Dostoiévski):

Sou um homem doente… Sou mau. Não tenho atrativos. Acho que sofro do fígado. Aliás, não entendo bulhufas da minha doença e não sei com certeza o que é que me dói. Não me trato, nunca me tratei, embora respeite os médicos e a medicina. Além de tudo, sou supersticioso ao extremo; bem, o bastante para res­peitar a medicina. (Tenho instrução su­fi­ciente para não ser supersticioso, mas sou.) Não, senhores, se não que­ro me tratar é de raiva. Isso os se­nho­res provavelmente não compre­en­dem.

  1. Grande Sertão: Veredas (Guimarães Rosa):

Nonada. Tiros que o senhor  ouviu foram de briga de ho­mem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do cór­rego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mo­cidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, er­roso, os olhos de nem ser — se viu —; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebi­tado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: deter­mi­naram — era o demo.

  1. O Complexo de Portnoy (Philip Roth):

Ela estava tão profundamente entranhada em minha consciência que, no primeiro ano na escola, eu tinha a impressão de que todas as professoras eram minha mãe disfarçada. Assim que tocava o sinal ao fim das aulas, eu voltava correndo para casa, na esperança de chegar ao apartamento em que morávamos antes que ela tivesse tempo de se transformar. Invariavelmente ela já estava na cozinha quando eu chegava, preparando leite com biscoitos para mim. No entanto, em vez de me livrar dessas ilusões, essa proeza só fazia crescer minha admiração pelos poderes dela.

  1. A Lua Vem da Ásia (Campos de Carvalho):

Aos 16 anos matei meu professor de lógica. Invocando a legítima defesa — e qual defesa seria mais legítima? — logrei ser absolvido por cinco votos a dois, e fui morar sob uma ponte do Sena, embora nunca tenha estado em Paris. Deixei crescer a barba em pensamento, comprei um par de óculos para míope, e passava as noites espiando o céu estrelado, um cigarro entre os dedos. Chamava-me então Adilson, mas logo mudei para Heitor, depois Ruy Barbo, depois finalmente Astrogildo, que é como me chamo ainda hoje, quando me chamo.

  1. O Apanhador no Campo de Centeio (J.D. Salinger):

Se querem mesmo ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como passei a porcaria da minha infância, o que os meus pais faziam antes que eu nascesse, e toda essa lenga-lenga tipo David Copperfield, mas, para dizer a verdade, não estou com vontade de falar sobre isso. Em primeiro lugar, esse negócio me chateia e, além disso, meus pais teriam um troço se contasse qualquer coisa íntima sobre eles. São um bocado sensíveis a esse tipo de coisa, principalmente meu pai. Não é que eles sejam ruins — não é isso que estou dizendo — mas são sensíveis pra burro.

  1. O Amanuense Belmiro (Cyro dos Anjos):

Ali pelo oitavo chope, chegamos à conclusão de que todos os problemas eram insolúveis. Florêncio propôs, então, um nono, argumentando que outro copo talvez trouxesse a solução geral. Éramos quatro ou cinco, em torno de pequena mesa de ferro, no bar do Parque. Alegre véspera de Natal! As mulatas iam e vinham, com requebros, sorrindo dengosamente para os soldados do Regimento de Cavalaria. No caramanchão, outras dançavam maxixe com pretos reforçados, enquanto um cabra gordo, de melenas, fazia a vitrola funcionar.

  1. A Metamorfose (Franz Kafka):

Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intran­quilos, em sua cama meta­morfo­seado num inseto monstruoso. Estava dei­tado sobre suas costas duras como couraça e, ao levantar um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado, mar­rom, dividido por nervuras arqueadas, no topo de qual a coberta, prestes a deslizar de vez, ainda mal se sustinha. Suas numerosas pernas, lastimavel­mente finas em comparação com o volume do resto do corpo, tremu­lavam desamparadas diante dos seus olhos.

  1. Dom Casmurro (Machado de Assis):

Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da Lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos. A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus. Sucedeu, porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.

  1. Anna Kariênina (Liev Tolstói):

Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira. Tudo era confusão na casa dos Oblónski. A esposa ficara sabendo que o marido mantinha um caso com a ex-governanta francesa e lhe comunicara que não podia viver com ele sob o mesmo teto. Essa si­tuação já durava três dias e era um tormento para os cônjuges, para todos os familiares e para os criados. Todos, familiares e criados, achavam que não fazia sentido morarem os dois juntos e que pessoas reunidas por acaso em qualquer hospedaria estariam mais ligadas entre si do que eles.

  1. O Ventre (Carlos Heitor Cony):

Positivamente, meu irmão foi acima de tudo um torturado. Sua tor­tura seria interessante se eu a explo­rasse com critério — mas jamais me preocupei com problemas do espírito. Belo para mim é um bife com batatas fritas ou um par de coxas macias. Não sou lido tampouco. A única atração que tive por livro limitou-se à ilustra­ção de um tratado de educação sexual que o vigário do Lins fez o pai comprar para nosso espiritual proveito. Só creio naquilo que possa ser atingido pelo meu cuspe. O resto é cristianismo e pobreza de espírito.

  1. Lolita (Vladimir Nabokov):

Lolita, luz de minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama. Lo-li-ta: a ponta da língua descendo em três saltos pelo céu da boca para tropeçar de leve, no terceiro, contra os dentes. Lo. Li. Ta. Pela manhã ela era Lô, não mais que Lô, com seu metro e quarenta e sete de altura e calçando uma única meia soquete. Era Lola ao vestir os jeans desbotados. Era Dolly na escola. Era Dolores sobre a linha pontilhada. Mas em meus braços sempre foi Lolita. Será que teve uma precursora? Sim, de fato teve. Na verdade, talvez jamais teria existido uma Lolita se, em certo verão, eu não houvesse amado uma menina primordial.

  1. O Jardim do Diabo (Luis Fernando Verissimo):

Me chame de Ismael e eu não atenderei. Meu nome é Estevão, ou coisa parecida. Como todos os homens, sou oitenta por cento água salgada, mas já desisti de puxar destas profundezas qualquer grande besta simbólica. Como a própria baleia, vivo de pequenos peixes da superfície, que pouco significam mas alimentam. Você talvez tenha visto alguns dos meus livros nas bancas. Todo homem, depois dos quarenta, abdica das suas fomes, salvo a que o mantém vivo. São aqueles livros mal impressos em papel jornal, com capas coloridas em que uma mulher com grandes peitos de fora está sempre prestes a sofrer uma desgraça.

  1. Dom Quixote (Miguel de Cervantes):

Desocupado leitor: sem juramento meu embora, poderás acreditar que eu gostaria que este livro, como filho da razão, fosse o mais formoso, o mais primoroso e o mais judicioso e agudo que se pudesse imaginar. Mas não pude eu contravir a ordem da natureza, que nela cada coisa engendra seu semelhante. E, assim, o que poderá engendrar o estéril e mal cultivado engenho meu, senão a história de um filho seco, murcho, antojadiço e cheio de pensamentos díspares e nunca imaginados por ninguém mais, exatamente como quem foi engendrado num cárcere, onde toda a incomodidade tem assento e onde todo o triste barulho faz sua habitação?

  1. Cem Anos de Solidão (Gabriel García Márquez):

Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo. Macondo era então uma aldeia de vinte casas de barro e taquara, cons­truídas à margem de um rio de águas diá­fanas que se precipitavam por um lei­to de pedras polidas, brancas e enor­mes como ovos pré-históricos. O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para men­cioná-las se precisava apontar com o dedo.

(Fonte)

Mesmo sabendo que toda lista já nasce incompleta, surpreendi-me ao constatar a ausência da introdução de “O Estrangeiro” que, para mim, configura-se uma das melhores introduções da literatura:

  1. O Estrangeiro (Albert Camus):

Hoje, mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi um telegrama do asilo: “Sua mãe faleceu. Enterro amanhã. Sentidos pêsames.” Isso não esclarece nada. Talvez tenha sido ontem.

Bônus:

Embora não se trate exatamente de uma introdução, mas de uma dedicatória, o clássico de Machado de Assis prende a atenção do leitor desde suas primeiras palavras:

  1. Memórias Póstumas de Brás Cubas (Machado de Assis):

Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas memórias póstumas.

Artigo: As “Vítimas de Goethe” e a onda de suicídios na Europa do século XVIII

Por Jonatas Brito


Goethe em 1828, pintura de Joseph Karl Stieler.

Goethe em 1828, pintura de Joseph Karl Stieler.

Em 1772, o jovem alemão Johann Wolfgang Von Goethe – então com 23 anos – chega à cidade de Wetzlar, na Alemanha, para iniciar sua carreira como advogado.  Nesta cidade, ele torna-se amigo de Christian Kestner e de sua noiva, Charlotte Buff. Embora comprometida, Goethe apaixona-se perdidamente por Charlotte e, ciente que não poderia concretizar tal sentimento, decide ir embora da cidade. Antes de sua saída, Goethe toma conhecimento por parte de Kestner que um amigo em comum, chamado Karl Wilhelm Jerusalem, pôs fim a sua própria vida com um tiro fatal na cabeça em razão de um amor não correspondido pela esposa de um colega. Esses dois fatos serviram de inspiração para que Goethe, em apenas quatro semanas, escrevesse o romance “Os Sofrimentos do Jovem Werther”, tornando-se assim um escritor de prestígio em toda Europa do século XVIII. Em seu romance de estreia, o autor narra a vida de Werther, jovem burguês que, através de cartas endereçadas ao seu amigo Guilherme, expõe sua paixão desmedida por Carlota, então prometida em casamento a Alberto*. Esse amor platônico tem um fim trágico: Werther, desiludido por um amor além de suas razões, suicida-se dando um tiro na cabeça, colocando um fim em sua idolatria por Carlota.

efeito wertherO que Goethe não esperava foi que sua obra causasse tanto alvoroço entre os leitores de sua época. Não era difícil encontrar, pelas ruas, jovens vestidos com botas, colete amarelo e casaco azul (exatamente quando Werther conheceu Carlota e quando foi encontrado agonizando após intentar contra a própria vida). Porém, o sucesso de sua obra foi além das inocentes imitações das vestimentas de seu protagonista, pois iniciou-se em toda a Europa uma onda de suicídios de jovens que, curiosamente, além de estarem vestidos tal como Werther, também foram encontrados exemplares do romance de Goethe em seus bolsos. A associação dos suicídios ao livro fez com que a obra primogênita do autor fosse proibida em diversos países, sob a acusação de incitação ao suicídio e ameaça aos usos e bons costumes (já que Werther cortejava uma mulher casada, embora nunca tenha sido comprovada, de fato, a influência negativa do romance sobre os amantes leitores europeus do século XVIII).

Goethe-Os_Sofrimentos_do_Jovem_WertherApós tal acontecimento deu-se início a vários estudos que ficaram mundialmente conhecidos na psicologia como o “Efeito-Werther” (Wertherfieber). Tal denominação refere-se a suicídios que ocorrem em um período curto de tempo e que seguem um determinado padrão. Por essa razão alguns estudiosos defendem que o suicídio é, de alguma forma, um ato contagioso. Ou seja, se considerarmos Werther (mesmo sendo um personagem fictício) o primeiro a cometer tal ato motivado por uma desilusão amorosa, esse mesmo ato encorajará um leitor qualquer, que se identifica com o personagem, a imitá-lo e isso incitará a outro, que motivará a outro e assim sucessivamente. Essa teoria foi reforçada ao ser constatado que as “vítimas de Goethe” eram, em sua maioria, pessoas de baixíssima autoestima, que viviam paixões obsessivas e não correspondidas e que eram atormentados por crises existenciais. Polêmicas à parte, o fato é que “Os Sofrimentos do Jovem Werther” tornou-se um clássico em todo o mundo e também um dos principais e mais importantes representantes do Romantismo na literatura universal.

Enfim, o que não podemos negar é que a literatura realmente possui o poder de influenciar (para o bem ou para o mal) toda nossa forma de pensar, de agir e de enxergar o mundo ao nosso redor. Por causa dela revoluções aconteceram, religiões foram criadas e crimes foram (e ainda são) cometidos.  Talvez por essa razão que Goethe gabava-se por saber que Napoleão Bonaparte, além de ter lido sua obra sete vezes, sempre levava um exemplar em seu bolso.

*Nomes dos personagens na versão portuguesa do romance.

Artigo: Por que o brasileiro lê tão pouco?

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Por Jonatas Brito


Uma pesquisa realizada pela Fecomercio-Rj (Federação do Comércio do Rio de Janeiro), divulgada ano passado pelo Jornal da Globo¹, revelou uma estatística preocupante para nós, brasileiros: 70% dos entrevistados não leram um livro sequer em 2014. De acordo com a pesquisa, esse triste fato deve-se principalmente ao crescente uso da internet e à crise econômica que assola o país. Mas a pergunta que não quer calar é: será?

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Desde que Adão comeu do fruto proibido e colocou a culpa em Deus por ter lhe dado a mulher, o ser humano adquiriu o péssimo hábito de transferir suas culpas e mazelas para outras pessoas, ou situações. É fácil dizer que ao responsável pelo baixíssimo índice de leitores entre nós deve-se, principalmente, ao avanço tecnológico, ao alto preço dos livros ou à crise. Isso tira um pesado fardo de nossas costas, correto? Porém, de acordo com a socióloga Zoara Failla, do Instituto Pró-Livro “O que mais afasta os brasileiros da leitura não é o preço dos livros ou a dificuldade de acesso e, sim, a falta de interesse” ². Vamos conversar um pouco sobre alguns dos motivos que faz do brasileiro um mau leitor?

  1. O péssimo primeiro contato com a literatura:
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Paradoxalmente, a escola acaba afastando os alunos do hábito da leitura. Os professores indicam clássicos da literatura que são irrelevantes para jovens que ainda estão engatinhando no universo literário. Ainda de acordo com Zoara Failla “Os professores costumam indicar livros clássicos do século 19, maravilhosos, mas que não são adequados a um jovem de 15 anos. Apresentado só a obras que considera chatas, ele não busca mais o livro depois que sai do colégio” ³. Lembro-me perfeitamente quando, no ginásio, uma professora me obrigou a ler O Ateneu, de Raul Pompéia para uma prova. O livro é um clássico, mas levei quase três meses para lê-lo. Não era o momento. Recordo-me também que, anos mais tarde, outra professora pediu para que cada aluno escolhesse um livro para leitura em sala de aula. Escolhi O Gênio do Crime, de João Carlos Marinho, e a experiência foi completamente recompensadora.

Mas a escola não é a principal culpada ou responsável por desenvolver nos alunos o hábito pela leitura. A responsabilidade maior e o exemplo têm que vir de dentro de casa. Os pais são os principais agentes influenciadores na formação do caráter de seus filhos, e pais que leem formam filhos leitores. Se a criança não encontra esse incentivo em casa, dificilmente encontrará fora.

  1.  A própria falta de interesse em ler:

Ler – ainda que seja algo que você goste – exige esforço, abnegação, atenção, paixão. Por essas e outras razões posso afirmar – e as pesquisas não me deixam mentir – que o brasileiro é um povo preguiçoso no que se refere à leitura. E se você é uma exceção, parabéns! Isso só confirma a regra. Muitas são as desculpas (lembra-se de Adão?!). A maioria das pessoas que alegam falta de tempo para ler são as mesmas que não perdem um chopp com os amigos ou um episódio de sua novela favorita. Outra desculpa recorrente são os altos preços dos livros. Mas garanto que gastamos muito mais em uma mesa de bar do que na compra de um bom livro. A internet está repleta de sites com livros em promoção; sem contar a infinidade de sebos. Alegar que o avanço tecnológico dificultou o prazer pela leitura é mais uma falácia. A internet mais do que ampliou o acesso à literatura. A rede mundial de computadores está repleta de blogs, vlogs e e-books disponíveis para todo tipo de gosto literário. Tudo é uma questão de vontade, de interesse.

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Fonte: Google Imagens

Já ouvi muitas pessoas dizerem da dificuldade das mesmas em concentrar-se em uma leitura. Que sempre começam, mas nunca terminam o que estão lendo. Minha resposta é sempre a mesma: “Você precisa encontrar um tipo de leitura da qual se identifique”. Algumas pessoas gostam de romances policiais, outras de ficção científica, outras de romances de época, outros de autoajuda (por que não!). O importante é, antes de tudo, encontrar-se dentro desse vasto universo literário, que o prazer e o hábito virão logo em seguida. Por experiência própria, depois que devorei Crime e Castigo, de Dostoiévski, um novo mundo se abriu em minha frente. Comecei a ler compulsivamente outras obras dele e de vários escritores russos. E como uma leitura puxa outra – dentro da mesma escola literária – me apaixonei pela escrita realista de Machado de Assis. Enfim, me achei. Ler é um remédio que não há contraindicação. Quem lê desenvolve senso crítico, melhora suas relações interpessoais, é mais criativo, possui maior capacidade interpretativa, é mais prático na resolução de problemas, tem mais facilidade em conseguir um bom emprego entre outros inúmeros benefícios.

Criar um blog de resenhas literárias é desafiador por duas razões. 1) porque já há na internet (olha ela ajudando!) inúmeros blogs e vlogs que já fazem isso há mais tempo que nós e, por isso, possuem muito mais conteúdo, experiência e seguidores; 2) porque, como já disse em todo o artigo, ler não é algo natural para o brasileiro. Por isso que nossa proposta é realizar resenhas curtas, apenas com algumas informações necessárias e nossas impressões para aguçar (ou não!) a vontade do leitor pelo livro. Porém, o que nos motiva a continuar é saber que: se “um país é feito de homens e livros” – como disse Monteiro Lobato -, mesmo a passos lentos, estamos fazendo a nossa parte.

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Fonte: Google Imagens

 

Referências:

¹ Polato, A. (11 de 09 de 2012). Zoara Failla: “Se o professor não é leitor, não consegue transmitir o prazer pela leitura”. Acesso em 06 de 01 de 2016, disponível em Revista Época: http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2012/09/zoara-failla-se-o-professor-nao-e-leitor-nao-consegue-transmitir-o-prazer-pela-leitura.html

² Redação Super. (11 de 2010). Por que o brasileiro lê pouco? Acesso em 06 de 01 de 2016, disponível em Super: http://super.abril.com.br/cultura/por-que-o-brasileiro-le-pouco

³ Teles, L. (01 de Abril de 2015). G1. Acesso em 06 de Janeiro de 2016, disponível em G1: http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2015/04/70-dos-brasileiros-nao-leram-em-2014-diz-pesquisa-da-fecomercio-rj.html